Relatório do debate sobre Quem contribuiu para esse artigo, afinal?


UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOMÉDICAS

DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E BIOFÍSICA

 

 

Relatório apresentado à disciplina: Debates Atuais Em Ciências Biomédicas

 

Organizadores: Amanda Baron Campaña

Ana F. Barros Ferreira

Flávio Augustino Back

Hugo Henrique Hirata

Rhowena J. B. Matos

 

            O debate realizado no dia 09 de maio do ano corrente, às 17h, cujo tema abordado foi: “ QUEM CONTRIBUIU PARA ESSE ARTIGO, AFINAL ? ” teve a participação dos convidados Prof. Dr. Walter Coli (Professor Titular do Departamento de Bioquímica do Instituto de Química da USP - Presidente da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança [CTNBio] - Coordenador Adjunto da FAPESP - Área Ciências da Vida), Dra. Rosângela Monteiro (Biologista-chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e autora do artigo "Critérios de autoria em trabalhos científicos: um assunto polêmico e delicado") e Dra. Sara Albiere ((Professor Doutor do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP). O objetivo geral do debate foi discutir os pontos práticos e teóricos para a inclusão de autores em artigos científicos. A organização do debate constituiu de explanação dos debatedores, na qual cada participante da mesa teve 15 minutos para exposição dos seus pontos de vista e conhecimentos sobre o assunto. Logo após as apresentações, o debate foi aberto para perguntas da platéia.

            Dra. Rosângela iniciou o debate com definições sobre autoria científica e a importância no meio acadêmico. Algumas vantagens foram enumeradas, como : a sedimentação das responsabilidades assumidas quando se é autor, o reconhecimento de esforço intelectual pela comunidade científica, o prestígio, garantir continuidade de financiamentos, dentre outras. Em seguida, abordou a existência da Política “Publish or Perish”, explicitando a importância da produção científica como “moeda corrente"  como forma de avaliação dos pesquisadores e professores para contratação e financiamentos. Essa cobrança leva a inflação do número de autores em publicações, assim como desvios e práticas não éticas, como autoria convidada, autoria “irmãos siameses”, autorias fantasmas e autoria pressionada. A Dra. Rosângela finalizou a apresentação comentando sobre as implicações de autorias não éticas, como injustiças na concessão de financiamentos, disputa po vagas em concursos acadêmicos e até mesmo em relacionadas a ascensão na carreira acadêmica. Além disso, o comprometimento da transparência e da credibilidade da pesquisa podem ficar prejudicados. Ressaltou também, o papel do pesquisador como referência e executor das premissas éticas, cabendo a ele participar ou não de práticas desonestas. Por fim, sugeriu a utilização de um sistema de pontuação para classificar o grau de contribuição em pesquisas como tentativa de padronização da inclusão de autores em trabalhos científicos.

            O segundo expositor foi o Prof. Dr. Walter Coli que concordou em muitos aspectos com as idéias apresentadas pela Dra. Rosângela. Entretanto, o Prof. ressaltou que cada caso, sobre critérios de inclusão de autoria, deve ser analisado individualmente e em áreas de pesquisa onde o auxílio se dá “corpo a corpo”. Assim, segundo o professor, todos os indivíduos que participam de alguma forma da pesquisa devem ser considerados co-autores. Levantou também a questão cultural na determinação da ordem de autores, já que em algumas situações isto pode confundir o leitor. Por exemplo, a cultura européia tem tradição de colocar o chefe do grupo como primeiro autor, enquanto que a norte-americana coloca o aluno como primeiro autor. Finalmente, chamou atenção sobre a necessidade da punição para aqueles que incluem arbitrariamente autores em trabalhos visando benefício próprio, como forma de coação a essa prática.

A terceira e última exposição foi da Prof. Dra. Sara, que comentou as reverberações da política “publique ou pereça” nas ciências humanas. Destacou o oportunismo e a falta de ética presentes nesta “corrida” pela produção científica para o preenchimento dos critérios de avaliação do pesquisador segundo o número de artigos publicados. A partir desta constatação, ela apresentou a necessidade de padronizações para a inclusão de autores em artigos e o retorno à avaliação qualitativa. Afirmou ainda que “matematizar não é uma solução para todos os casos”. Posteriormente, falou sobre o papel do orientador nestes casos. Segundo ela, o orientador não deve apenas estabelecer padrões de pesquisa, mas também padrões de conduta e de ética, ele deve ser um exemplo para a formação de caráter.

            As perguntas da platéia iniciaram-se com uma questão para o Prof. Dr. Coli a respeito da avaliação das publicações pelo impacto das revistas em que foram publicadas. Segundo o Prof. Dr. Coli, uma revista de alto impacto é mais respeitada pela comunidade científica e dessa forma um indivíduo o qual publicou na Nature, por exemplo, passou por um critério extremamente rigoroso de avaliação e por isso deve ser respeitado. O prof. citou ainda outras formas de avaliação, como o índice H. A Prof. Dra. Sara acrescentou que os números devem funcionar como um apoio para a avaliação de um indivíduo, mas não como um elemento central desta avaliação. Para Dra Rosângela, a utilização do “número” de citações como forma de avaliação é um critério distorcido, já que o indivíduo pode ser citado cem vezes, mas estas podem ser críticas ao trabalho, ou pode acontecer do artigo ser recente e não ter dado tempo para este ser citado. O Prof. Dr. Coli acrescentou que não devem ser feitas comparações entre pessoas com idades muito diferentes. A pergunta seguinte foi sobre a opinião dos debatedores a respeito da inclusão na autoria do trabalho de uma pessoa que auxiliou na redação apenas. A Dra Rosângela e o Prof. Dr. Coli manifestaram-se concordando que auxílio na redação não constituía autoria.

    A seguir foram levantadas questões sobre currículo oculto (a importância de assistir concursos públicos) e a responsabilidade que a banca avaliadora deve ter, já que muitas vezes é observado que o critério predominante é o número de publicações. A Prof. Dra. Sara comentou ainda que se deve assumir que a avaliação é subjetiva, pessoal e qualitativa para justificar a escolha de um candidato em detrimento de outro, enquanto que os dados numéricos (número de publicações) devem servir como uma forma de apoio. Outro assunto abordado no desfecho do debate foi a quantidade de patentes que o pesquisador possui, podendo ser traduzido como capacidade de captação de recursos para a universidade, o que seria bastante atrativo. Finalmente, o debate foi encerrado com um alerta para o fato de que muitos usam os critérios de avaliação para justificar suas escolhas e mostrarem-se imparciais.